27.12.15

COLÓQUIO DE JESUS COM NICODEMOS - Parte I

    "Havia um homem dentre os fariseus, chamado Nicodemos, principal entre os judeus; este foi ter com Jesus à noite e disse-lhe: Rabi, sabemos que és Mestre vindo da parte de Deus; pois ninguém pode fazer estes milagres que tu fazes, se Deus não estiver com ele, Jesus respondeu-lhe: Em verdade, em verdade te digo que se alguém não nascer de novo, não pode ver o Reino de Deus. Perguntou-lhe Nicodemos: Como pode um homem nascer sendo velho? Pode, porventura, entrar novamente no ventre de sua mãe e nascer? Respondeu Jesus: Em verdade, em verdade te digo que, se alguém não nascer da água e do Espírito, não pode entrar no Reino de Deus. O que é nascido da carne é carne, o que é nascido do Espírito é Espírito. É-vos necessário nascer de novo. O vento sopra onde quer, e ouves a sua voz, mas não sabes donde vem, nem para onde vai: assim é todo aquele que é nascido do Espírito. Como pode ser isso? perguntou-lhe Nicodemos. Respondeu-lhe Jesus: Tu és mestre em Israel e não entendes estas coisas? Em verdade, em verdade te digo que falamos o que sabemos e testificamos o que temos visto e não recebeis o nosso testemunho. Se vos tenho falado das coisas terrenas, e não me credes, como que crereis, se vos falar das celestiais? Ninguém subiu ao Céu, se não aquele que desceu do Céu, a saber, o Filho do Homem. Como Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do Homem seja levantado, para que todo o que nele crê tenha a vida eterna".              (João, III, 1-15. )

    Este Evangelho prega o encontro de Jesus com Nicodemos: ou por outra, a visita que Nicodemos fez ao nazareno, à noite.
    Vamos estudá-lo em sua simplicidade edificante e procuremos compreendê-lo, porque do seu conhecimento nos vem uma soma considerável de luzes e verdades.
    Diz o trecho que: "Havia um homem dentre os fariseus, chamado Nicodemos, principal entre os judeus e este foi ter, à noite, com Jesus".
    Os fariseus eram, como foi descrito no capítulo, "Fermento dos Fariseus e Saduceus", um grupo muito grande de indivíduos, que formavam uma religião, como atualmente é grande o número de pessoas que compõem a religião de Roma.
    Entretanto, quanto à pessoa deste chefe do farisaísmo, não era um homem mau, ao contrário, dentre todos os sacerdotes dessa religião, pois salienta o Evangelho que se mostravam tolerantes para com a palavra de Jesus Cristo. Um era Gamaliel, que foi mestre de Paulo, antes que este apóstolo se tornasse cristão; e o outro foi Nicodemos.
    Mas vós sabeis que o orgulho, o respeito humano e o preconceito constituem embaraços muito grandes para a nossa espiritualização, para nos aproximarmos de Jesus.
    Nicodemos era, pois, um homem bom, e, por esse motivo, desejava imensamente encontrar-se com Jesus, para conversar com o Mestre sobre assunto religioso, porque tivera notícias das pregações do nazareno e das curas que ele fazia.
    Mas como era rico, principal entre os judeus, era "mestre da religião farisaica" e não queria que o povo e os outros sacerdotes da sua seita soubessem dos seus desejos mais íntimos; e para que tudo ficasse escondido, em reserva, resolveu procurar Jesus à noite, porque assim ninguém ficaria sabendo da visita.
    Por isso diz o evangelista João: Nicodemos foi ter com Jesus à noite.
    Em chegando à casa onde o Mestre estava hospedado, que era na cidade de Jerusalém, por ocasião de uma festa de Páscoa, que os judeus celebravam, o "principal fariseu" entabulou conversação com Jesus dizendo-lhe: "Rabi, sabemos que és Mestre, vindo da parte de Deus, pois ninguém pode fazer estes milagres que fazes, se Deus não estiver com ele".
    Por esta saudação, vós podeis perfeitamente compreender que Nicodemos não era um descrente, ou inimigo de Jesus; ao contrário, era um crente nos milagres operados por Jesus, que consistiam, quase que totalmente em curas de enfermos diversos.
    Quanto, pois, a essa parte que se relaciona com os fatos produzidos pelo nazareno, Nicodemos neles acreditava, portanto em desacordo com os demais sacerdotes da sua "religião", enquanto estes diziam que Jesus agia sob a influência do diabo, Nicodemos cria piamente que a influência que assistia o nazareno era divina; tanto assim que ele diz: Ninguém pode fazer estes milagres que tu fazes, se Deus não estiver com ele. O que faltava pois a Nicodemos para se tornar cristão, para seguir a Jesus? Desde que ele acreditava nos fatos, nos fenômenos, como os chamamos hoje; desde que achava que esses fatos eram autorizados por Deus, não os atribuindo à origem diabólica, por que não se apresentou logo como um dos discípulos do nazareno?
    Isto quer dizer que não basta crer nos milagres, nos fatos, nas curas que assinalam, por certa forma, o Cristianismo, para sermos cristãos.
    Precisamos também crer na palavra, na doutrina que Jesus pregava.
    Em nosso tempo, como vemos, a maioria do povo também crê nos fenômenos, nas curas, e muitos são os que pedem remédios para a cura de suas enfermidades; são milhares os Nicodemos que, às ocultas, desejam conversar sobre Espíritos, sobre as almas, e que procuram saber a razão das causas que os determinam, mas, também como Nicodemos, continuam filiados às suas religiões, que amaldiçoam a legítima doutrina de Jesus, hoje, como os fariseus amaldiçoavam a mesma doutrina, ontem.
    Não basta crer nos fatos; é preciso compreendê-los depois de os haver estudado.
    Não basta dizer que os fatos vêm de Deus, é preciso saber como eles vêm de Deus. E para chegar ao conhecimento desses fatos, temos de estudar justamente o que Jesus fazia questão que fosse estudado, ou seja, a vida eterna.
    O ponto principal das pregações de Jesus era a vida eterna.
    Em torno da vida eterna é que sempre giravam os maravilhosos conceitos da sua filosofia, da sua doutrina de verdadeira fé, de amor puro e imaculado.
    Todas as sentenças de Jesus eram luzes, iluminando a vida eterna, a vida imortal.
    No Sermão do Monte, o Mestre, para consolar os sofredores, os humildes, os perseguidos, os mansos de coração, nada lhes dá, presentemente, senão a certeza da felicidade na imortalidade, e, por certa forma, se esforça para que todos esses que choravam e viviam coagidos e famintos tivessem certeza absoluta da imortalidade, dessa vida do além que é a vida eterna, na qual seriam todos fartos e providos de tudo o que necessitassem se ouvissem e cressem na sua palavra.
    Nicodemos, como se vê no texto do Evangelho, embora não fosse mau homem, estava tão impregnado dos ensinamentos da religião Farisaica, consistentes quase que só em cultos e práticas exteriores, que vacilava a respeito da outra vida, duvidava que o homem, depois de morto o corpo, pudesse continuar a viver, e que houvesse, de fato, uma vida real além do túmulo.
    Jesus conhecia essa parte fraca de Nicodemos, e foi por isso que, logo após a saudação do "primaz dos judeus", disse: Em verdade, em verdade te digo, que se alguém não nascer de novo, não pode ver o Reino de Deus.
    Estas primeiras palavras, ditas assim de supetão ao sacerdote de uma religião que se dizia a única verdadeira, tem profunda significação para aqueles que desejam estudar, conhecer e seguir a religião de Jesus Cristo.
    Assim como a criança recém-nascida não tem religião alguma, não está presa a nenhuma doutrina e nenhum conhecimento tem de coisa alguma, assim também devem colocar-se aqueles que querem estudar a religião de Jesus Cristo, porque a alma, estando cheia de religião antiga, que foi obrigada a receber por doação dos ascendentes, não pode receber a religião do Cristo, assim como uma casa que está habitada por uma família não tem lugar para receber outra família ou outros moradores.
    Jesus, dizendo a Nicodemos: Se alguém não nascer de novo, não pode ver o Reino de Deus, disse antecipadamente ao "primaz dos judeus" que, fosse quem fosse, não alcançaria a graça do Reino de Deus se continuasse preso ao Reino do mundo, no qual prevalecem as doutrinas dos sacerdotes, as doutrinas e religiões de invenção humana.
    Precisava, primeiro de tudo, sair desse reinado, deixar essa obediência, pôr de lado todos esses dogmas, todos esses sacramentos, todos esses cultos, todos esses falsos ensinos, e tornar-se ignorante como uma criança que nasce de novo.
    Assim como uma criança nasce para este mundo, tendo vindo do outro e nada se lembrando desse outro mundo donde veio, assim também o homem deve deixar aquela religião arcaica, na qual vive sem conhecer a verdade e sem ter consolação de espécie alguma, para depois aprender o que o Cristo Jesus está ensinando.
    Por outras palavras: pôr de lado todo espírito preconcebido, todo orgulho de saber, todo egoísmo de virtudes, toda presunção de estar de posse da verdade; porque o "camelo" assim carregado não pode entrar no Reino do Céu.
    Acresce ainda outra circunstância: ninguém pode carregar dois pesos; embora a doutrina de Jesus seja leve, o "camelo" sobrecarregado e quase sem poder andar com tanta carga, não a suportará; assim como não se podem impor a quem quer que seja dois jugos. O boi, que tem um jugo que já lhe molesta muito o pescoço, que sangra e caleja, não admitirá mais outro jugo, embora seja suave como a palavra do Mestre, pois em última hipótese, ele não ficará sabendo qual o jugo que lhe pesa; por isso, assim como o camelo precisa alijar uma carga, Para tomar a si outro fardo; assim como o boi precisa libertar-se do jugo que o oprime, para atrelar-se a outro jugo, assim também o homem precisa atirar para longe de si todas as crenças velhas que lhe pesam na consciência e lhe oprimem a alma, para receber a religião amorosa de Jesus, que, como disse o Mestre, não pesa, é suave e agradável de ser carregada.
    É este o primeiro nascimento que Jesus proclamou, como condição de salvação para todas as criaturas humanas, e especialmente para os sacerdotes de todas as religiões humanas, mesmo porque Jesus falava naquela ocasião a um religioso que era sacerdote e principal representante de religiosos e sacerdotes dessas religiões. (continua)


Livro: Parábolas e Ensinos de Jesus - Cairbar Schutel

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