- Eis aqui o nosso psicoscópio, de modo a
facilitar-nos exames e estudos, sem o impositivo de acurada concentração
mental.
- Psicoscópio? que novo engenho vem a ser
esse?
- É um aparelho a que intuitivamente se
referiu ilustre estudioso da fenomenologia espirítica, em fins do século
passado. Destina-se à auscultação da alma, com o poder de definir-lhe as
vibrações e com capacidade para efetuar diversas observações em torno da
matéria - esclareceu Áulus, com leve sorriso.
- Esperamos esteja, mais tarde, entre os
homens. Funciona à base de eletricidade e magnetismo, utilizando-se de
elementos radiantes, análogos na essência aos raios gama.
É constituído por óculos de estudo, com
recursos disponíveis para a microfotografia.
- Em nosso esforço de supervisão, podemos
classificar sem dificuldade as perspectivas desse ou daquele agrupamento de
serviços psíquicos que aparecem no mundo. Analisando a psicoscopia de uma
personalidade ou de uma equipe de trabalhadores, é possível anotar-lhe as
possibilidades e categorizar-lhes a situação. Segundo as radiações que
projetam, planejamos a obra que podem realizar no tempo.
- Quer isso dizer que qualquer de nós pode
ser submetido a exame dessa espécie?
- Sem dúvida - considerou o nosso
interlocutor bem-humorado -; decerto que estamos sujeitos às sondagens dos
planos superiores, tanto quanto pesquisamos agora os planos que se nos situam à
retaguarda. Se o espectroscópio permite ao homem perquirir a natureza dos
elementos químicos, localizados a enormes distâncias, através da onda luminosa
que arrojam de si, com muito mais facilidade identificaremos os valores da
individualidade humana pelos raios que emite. A moralidade, o sentimento, a
educação e o caráter são claramente perceptíveis, através de ligeira inspeção.
-Mas e na hipótese de surgirem elementos
arraigados ao mal, numa formação de cooperadores do bem? De posse da ficha
psicoscópica, os instrutores espirituais providenciar-lhes-ão a expulsão?
Não será preciso. Se a maioria permanece
empenhada na extensão do bem, a minoria encarcerada no mal distancia-se do
conjunto, pouco a pouco, por ausência de afinidade.
- Contudo que acontece numa instituição
cujo programa elevado se degenera em desequilíbrio, induzindo-nos a reconhecer
que a virtude aí não passa de bandeira fictícia, acobertando a ignorância e a
perversidade?
- Então, nesse caso, dispensamos qualquer
regime de perseguição ou denúncia. Encarrega-se a vida de colocar-nos no lugar
que nos compete.
E, sorrindo, ajuntou:
- Os Anjos ou Ministros da Eterna Sabedoria
entregam-nos, com segurança, às forjas renovadoras do tempo e da provação.
Sabe-se, atualmente, na Terra, que um grama de rádio perde a metade do seu peso
em dezesseis séculos e que um ciclotron, trabalhando com projeteis atômicos
acelerados a milhões de electrons-volt, realiza a transmutação dos elementos
químicos, de imediato. A evolução vagarosa nos milênios ou o choque brusco do
sofrimento alteram-nos o panorama mental, aprimorando-lhe os valores.
- Imaginemos uma sociedade humana que
pudesse retratar a vida interior dos seus membros ... Isso economizaria grandes
quotas de tempo na solução de inúmeros problemas psicológicos.
- Sim - anuiu o mentor, cordial -, o futuro
reserva prodígios ao senso do homem comum.
Havíamos, porém, alcançado o portão de
espaçoso edifício que o Assistente nos designou como sendo o santuário que nos
competia visitar e servir.
- Esta é a casa espírita-cristã onde
encontraremos nosso ponto básico de experiências e observações.
Entramos.
Atravessado largo recinto, em que
estacionavam numerosas entidades menos felizes de nosso plano, o orientador
esclareceu:
- Vemos aqui o salão consagrado aos
ensinamentos públicos. Todavia, o núcleo que buscamos jaz situado em reduto
íntimo, assim como o coração dentro do corpo.
Escoados alguns instantes, penetramos
acanhado aposento, onde se consagrava reduzida assembléia, em silenciosa
concentração mental.
- Nossos companheiros - elucidou o
Assistente - fazem o serviço de harmonização preparatória. Quinze minutos de
prece, quando não sejam de palestra ou leitura com elevadas bases morais. Sabem
que não devem abordar o mundo espiritual sem a atitude nobre e digna que lhes
outorgará a possibilidade de atrair companhias edificantes e, por esse motivo,
não comparecem aqui sem trazer ao campo que lhes é invisível as sementes do
melhor que possuem.
Hilário e eu nos inclinávamos à indagação,
contudo, a respeitabilidade do recinto impunha-nos silêncio.
Amigos da nossa esfera ali se demoravam em
oração, compelindo-nos a estranhado recolhimento.
O Assistente armou o psicoscópio e, depois
de ligeira análise, recomendou-nos a observação.
Chegada a minha vez de usá-lo,
assombraram-me as peculiaridades do aparelho.
Sem necessidade de esforço mental, notei
que todas as expressões de matéria física assumiam diferente aspecto,
destacando-se a matéria de nosso plano.
Teto, paredes e objetos de uso corriqueiro
revelavam-se formados de correntes de força, a emitirem baça claridade.
Detive-me na contemplação dos companheiros
encarnados que agora apareciam estreitamente associados entre si, pelos vastos
círculos radiantes que lhes nimbavam as cabeças de opalino esplendor.
Tive a impressão de fixar, em torno do
apagado bloco de massa semi-obscura a que se reduzira a mesa, uma coroa de luz
solar, formada por dez pontos característicos, salientando-se no centro de cada
um deles o semblante espiritual dos amigos em oração.
Desse colar de focos dourados alongava-se
extensa faixa de luz violeta, que parecia contida numa outra faixa de luz
alaranjada, a espraiar-se em tonalidades diversas que , de momento, não pude
identificar, de vez que a minha atenção estava presa ao círculo dos rostos
fulgurantes, visivelmente unidos entre si, à maneira de dez pequeninos sóis,
imanados uns aos outros. Reparei que sobre cada um deles se ostentava uma
auréola de raios quase verticais, fulgentes e móveis, quais se fossem diminutas
antenas de ouro fumegante. Sobre essas coroas que se particularizavam, de
companheiro a companheiro, caíam do Alto abundante jorros de luminosidade
estelar que, tocando as cabeças ali irmanadas, pareciam suaves correntes de
força a se transformarem em pétalas microscópicas, que se acendiam e apagavam,
em miríades de formas delicadas e caprichosas, gravitando, por momentos , ao
redor dos cérebros em que se produziam, quais satélites de vida breve, em torno
das fontes vitais que lhes davam origem.
Custodiando a assembléia, permaneciam os
mentores espirituais presentes, cada qual irradiando a luz que lhe era própria.
Admirado, porém, com os irmãos da esfera
física, a se revelarem tão afins, na onda brilhante em que se reuniam, perguntei,
entusiástico:
- Áulus amigo, os companheiros que
visitamos são, porventura, grandes iniciados na revelação divina?
O interpelado estampou um gesto de
bom-humor e respondeu:
- Não. Achamo-nos ainda muito longe de
semelhantes apóstolos. Vemo-nos aqui na companhia de quatro irmãs e seis irmãos
de boa-vontade. Naturalmente, são pessoas comuns. Comem, bebem, vestem-se e
apresentam-se na Terra sob o aspecto vulgar de outras criaturas do ramerrão
carnal; no entanto, trazem a mente voltada para os ideais superiores da fé
ativa, a expressar-se em amor pelos semelhantes.
Procuram disciplinar-se, exercitam a
renúncia, cultivam a bondade constante e, por intermédio do esforço próprio no
bem e no estudo nobremente conduzido, adquiriram elevado teor de radiação
mental.
Hilário, que utilizara o psicoscópio em
primeiro lugar, alegou com o deslumbramento de uma criança espantada:
- Mas, e a luz? a matéria que conhecemos no
mundo transfigurou-se. Tudo aqui se converteu em claridade nova! O espetáculo é
magnífico!...
- Nada de estranheza - falou o Assistente,
bondoso -, não sabe você que um homem encarnado é um gerador de força
electromagnética, com uma oscilação por segundo, registrada pelo coração?
Ignora, porventura, que todas as substâncias vivas da Terra emitem energias,
enquadradas nos domínios das radiações ultravioletas? Em nos reportando aos
nossos companheiros, possuímos neles almas regularmente evolutidas, em apreciáveis
condições vibratórias pela sincera devoção ao bem, com esquecimento dos seus
próprios desejos. Podem, desse modo, projetar raios mentais, em vias de
sublimação, assimilando correntes superiores e enriquecendo os raios vitais de
que são dínamos comuns.
Raios vitais? - redargüiu meu colega,
faminto de esclarecimento.
- Sim, para maior limpidez da definição,
chamemos-lhes raios ectoplásmicos, unindo nossos apontamentos à nomenclatura
dos espiritistas modernos. Esses raios são peculiares a todos os seres vivos. É
com eles que a lagarta realiza suas complicadas demonstrações de metamorfose e
é ainda na base deles que e efetuam todos os processos de materialização
mediúnica, porquanto os sensitivos encarnados que os favorecem libertam essas
energias com mais facilidade. Todas as criaturas, porém, guardam-nas consigo,
emitindo-as em frequência que varia em cada uma, de conformidade com as tarefas
que o Plano da Vida lhes assinala.
E, otimista, acrescentou:
- O estudo da mediunidade repousa nos alicerces
da mente com o seu prodigioso campo de radiações.
A ciência dos raios imprimirá, em breve,
grande renovação aos setores culturais do mundo.
Aguardemos o porvir.
Em seguida, Áulus convidou-nos a inspecção
mais direta e acompanhamo-lo, alegremente.
Livro: Nos Domínios da
Mediunidade - Francisco C Xavier - André Luiz.