7.12.17

O CEGO DE SILOÉ

Parte I

    "Jesus, ao passar, viu um homem cego de nascença. Perguntaram-lhe seus discípulos: Mestre, quem pecou para que este nascesse cego, ele ou seus pais? Respondeu Jesus: Nem ele pecou nem seus pais, mas isto se deu para que as obras de Deus nele sejam manifestas. É necessário que façamos as obras de quem me enviou enquanto é dia; vem a noite, quando ninguém pode trabalhar. Estando eu no mundo, sou a luz do mundo. Tendo assim falado e fazendo lodo com saliva, aplicou-o nos olhos do cego, dizendo: Vai lavar-te no tanque de Siloé (que quer dizer, Enviado ). Ele foi, lavou-se e voltou com vista. Então os vizinhos e os que dantes o conheciam de vista, como mendigo, perguntavam: Não é este o que se assentava para mendigar? E ele mesmo, respondiam uns; não é, mas é parecido com ele, diziam outros. Porém ele dizia: Sou eu mesmo. Perguntaram-lhe, pois: Como te foram abertos os olhos? Respondeu ele: Aquele homem chamado Jesus fez lodo, ungiu-me os olhos e disse: Vai a Siloé e lava-te: então fui, lavei-me e fiquei vendo. E eles perguntaram: Onde está ele? Respondeu: não sei".
   "Levaram aos fariseus o que fora cego. Ora, era Sábado o dia em que Jesus fez lodo e lhe abriu os olhos. Então os fariseus, por sua vez, perguntaram-lhe como recebera a vista. Ele respondeu: Aplicou lodo aos meus olhos, lavei-me e agora vejo. Pelo que alguns dos fariseus diziam: como pode um homem pecador fazer tais milagres? E havia dissensão entre eles. Tornaram a perguntar ao cego: Que dizes tu a respeito dele, visto que te abriu os olhos? É profeta, respondeu ele. Mas os judeus não acreditaram que ele tivesse sido cego e tivesse recebido a vista, enquanto não chamaram os pais dele e os interrogaram: É este vosso filho, que vós dizeis ter nascido cego? Como, pois, vê agora? Responderam seus pais: Sabemos que este é nosso filho e que nasceu cego; mas como agora vê, não sabemos, ou quem lhe abriu os olhos, nós não sabemos; interrogai-o, já tem idade; ele mesmo falará por si. Isto disseram seus pais porque tinham medo dos judeus; porquanto estes já tinham combinado que se alguém confessasse ser Jesus o Cristo, fosse expulso da sinagoga. Por isso disseram seus pais: Ele já tem idade, interrogai-o. Então chamaram pela Segunda vez o homem que fora cego e lhe disseram: Dá glórias a Deus: nós sabemos que este homem é pecador. Ele respondeu: Se é pecador eu não sei: uma coisa sei: Eu estava cego e agora vejo. Perguntaram-lhe, pois: Que te fez ele? Como te abriu os olhos? Ele lhes respondeu: Já vo-lo disse e não ouvistes: por que quereis ouvir outra vez? Porventura quereis também vós tornar-vos seus discípulos? E injuriaram-no e disseram: Discípulo dele és tu; mas nós somos discípulos de Moisés, mas este não sabemos donde ele é. Respondeu-lhes o homem: É maravilhoso que não saibais donde ele é, e contudo, ele me abriu os olhos. Sabemos que Deus não ouve a pecadores, mas se alguém temer a Deus e fizer a sua vontade, a este ele ouve. Desde que há mundo, nunca se ouviu que alguém abrisse os olhos a um cego de nascença. Se este homem não fosse de Deus, nada poderia fazer. Eles lhe replicaram: Tu nasceste todo em pecados e nos estás ensinando? E lançaram-no fora."
    "Soube Jesus que o haviam lançado fora e encontrando-o, lhe perguntou: Crês tu no Filho do Homem? Quem é ele, Senhor, para que eu creia nele? Respondeu o homem.
    "Disse-lhe Jesus: Já o viste e é ele quem fala contigo. E ele disse: Creio Senhor; e o adorou. Jesus prosseguiu: Eu vim a este mundo para um juízo, a fim de que os que não vêem, vejam; e os que vêem, se tornem cegos. Ouvindo isto alguns dos fariseus, que estavam com ele, perguntaram-lhe: Porventura somos nós também cegos? Respondeu-lhes Jesus: Se fósseis cegos, não teríeis pecado algum; mas agora dizeis: Nós vemos; fica subsistindo o vosso pecado." (João, IX, 1-41).

    A vida de Jesus é uma lição extraordinária. Fonte de ensinamentos inesgotáveis que jorra para a vida eterna, só por ela seremos capazes de nos fortalecer para o cumprimento dos desígnios divinos.
    Todos os mestres da Terra têm errado e continuam a errar, só Jesus falou a eterna verdade, que irá sendo assimilada à proporção que crescermos no seu conhecimento e à medida que as graças de Deus abundarem em nós.
* * * * *
    Jesus passava e viu um homem que era cego de nascença, e logo que viu o cego conheceu tudo. Pela natureza da cegueira conheceu não só que o cego o era de nascença, mas também que seus pais não haviam pecado para que o cego assim nascesse, isto é, que a "mazela" não era hereditária.
    Conheceu mais o médico excelente: que a cegueira desse homem não provinha de pecado que ele houvesse cometido; mas, antes, que aquela enfermidade longe de ser um castigo, era uma graça de Deus, para que suas obras fossem manifestas.
    Três coisas podemos supor deste trecho que acabamos de ler:
    1 - Que a cegueira de nascença é produzida por pecados dos pais.
    2 - Que a cegueira de nascença é produzida por pecados do próprio cego.
    3 - Que a cegueira de nascença é graça de Deus para que suas obras sejam manifestas.
    Vamos analisar estas três proposições em ligeiros detalhes.
    A cegueira de nascença é produzida por pecado dos pais?
    Dura coisa é ir contra os ensinos sagrados, ou sofismar com o sentido das Escrituras.
    Como poderemos afirmar, de um lado, que os "filhos não pagam pelos pecados dos pais", e , de outro, dizer que "a cegueira de nascença é produzida por pecados dos pais"?
    Não será, porventura, uma injustiça e uma blasfêmia afirmar-se que, se os pais roubaram, injuriaram, mataram, perseguiram, os filho venham a sofrer as conseqüências destes desatinos, destes pecados, destes males praticados por seus progenitores?
    Se Jesus disse aos seus discípulos que cada um é responsável por suas obras, como posso eu responder pelos pecados de meus pais?
    Jesus nunca faltou com a verdade; sua palavra é de vida e de luz; nele não há trevas; como afirmar que "a cegueira pode Ter como causa os pecados dos pais?"
    Está escrito no trecho do Evangelho que acima transcrevemos, que, havendo os apóstolos perguntado ao Mestre: "Quem pecou para que este homem nascesse cego, ele ou seus pais?", Jesus respondeu: "Nem ele pecou nem seus pais."
    Pela pergunta dos apóstolos compreendemos que eles acreditavam ser a cegueira de nascimento ocasionada, ou por pecados de pais, ou por pecado do próprio Espírito.
    E pela resposta que Jesus lhes deu, também podemos compreender que esta crença não era destituída de fundamento, porque, se fosse, Jesus, que lhes estava ensinando, que era o Mestre de todos eles, lhes diria: "Errais no vosso pensamento, porque o pecado dos pais não pode cegar os filhos, assim como ninguém pode pecar antes de nascer."
    Mas Jesus não lhes disse isto: deixou que alimentassem a sua crença, o seu modo de pensar, e se limitou a afirmar, quanto àquele cego, que: "nem ele pecara, nem seus pais, mas se havia produzido aquela cegueira para que as obras de Deus fossem manifestas".
* * * * *
    De fato, de acordo com os ensinos do Cristo, iluminados pelo Espiritismo, os filhos não podem pagar pelos pecados dos pais, mas os pecados dos pais podem chegar ao auge de cegar os filhos.
    Eis aqui a interpretação da crença dos apóstolos, que Jesus não quis destruir: Se os pais furtam, os filhos não são responsáveis pelo furto; se eles matam, os filhos não são responsáveis pela morte; se eles mentem, caluniam, difamam, os filhos não têm de responder pela mentira, pela calúnia, pela difamação; mas se os pais educam os filhos nessas paixões, nesses vícios, esses defeitos dos pais se refletem nos filhos e os filhos pagam as conseqüências funestas dessa má educação; pela mesma forma, os pais têm de prestar severas contas a Deus pelas faltas que seus filhos praticarem, visto serem elas causadas pela educação que receberam no lar.
    De modo que, quer falando moralmente, quer falando espiritualmente, os pais são condenados pelas faltas dos filhos, e os filhos são condenados pelas faltas dos pais.
    Conta-se a história de uma mulher que nunca soube dar educação ao filho e que, tornando-se este ladrão e assassino, fora condenado à forca. Solicitado, como era de uso noutros tempos, a fazer o seu último pedido, disse Ter o desejo de beijar a sua mãe antes de morrer. Foi-lhe dada permissão e para tal fim fizeram a velha subir as escadas da forca, onde se achava o filho prestes a ser executado.
    Ele abraçou a mãe, e, chegando o seu rosto ao dela, com os dentes arrancou-lhe um pedaço de carne da face, e disse: "Tu és culpada do meu suplício; ele é o resultado da educação que me deste".
    Eis aí um fato que resume milhares de outros fatos que se verificam no mundo: de filhos sofrerem o pecado dos pais e pais sofrerem o pecado dos filhos.
    Assim como acontece no plano moral, também acontece no plano espiritual.
    Haverá mal que mais tenha feito sofrer os filhos do que a "religião" chamada "dos nossos pais"?
    Não é este o maior dos pecados dos pais, pelo qual pagam os filhos?
    O que acontece aos filhos de católicos e de protestantes que herdam, como se a religião fosse dinheiro, casa ou fazenda, a "religião de seus pais"?
    Nós temos tido a felicidade de estar em relação com o mundo espiritual e de conversar com os "mortos", sabemos bem de perto quão grandes são os sofrimentos dos que carregam para o além-túmulo essa herança sem valor. Embora os comunicantes não deixem de ser Espíritos de certa categoria, passam muito tempo em grande perturbação; caminham de um lado para outro sem encontrar o Céu, o Inferno e o Purgatório, que haviam recebido por "herança" de seus pais; e começam a verificar que os sacramentos que receberam nenhum benefício lhes fez, e até despertarem desse terrível pesadelo, bebem o fel que lhes foi dado, em vez da água pura da revelação espiritual! E a dor por que passam também os pais perturbados, ao verem assim alucinados seus filhos, a ponto de não os conhecerem, nem quererem ouvi-los, para se iniciarem na vida espiritual!
    Mesmo excluindo esse quadro muito comum, que se desenrola no outro plano da vida, não será um sofrimento atroz para um pai, pensar que seu filho foi para o "Inferno eterno" que lhe ensinaram existir do outro lado do túmulo? Ou então o filho que vê morrer seu pai ou sua mãe, julgar esses entes queridos condenados para sempre ao reino de Plutão?
    Eis como o pai paga pelo filho, e o filho pelo pai.
    Quando Jesus disse que: "quem amasse mais a seu pai, a sua mãe, a seus irmãos, a seus amigos do que a Ele, não seria digno dEle", quis afirmar que o pecado de crenças falsas e preconceitos dos pais é tão venenoso, tão prejudicial, que chega a contaminar os filhos, obscurecendo-lhes a visão da vida espiritual.
    Donde vêm as guerras, o ódio, o egoísmo, as dissensões? Não será das más crenças dos pais, refletindo-se nos filhos?
    Diz a sentença popular: "tal pai, tal filho", fazendo alusão a essa herança prejudicial que impede o progresso da família e da sociedade.
* * * * *continua.


Livro: Parábolas e Ensinos de Jesus - Cairbar Schutel

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