23.2.16

CIÊNCIA E TRISTEZA

A nossa estimada irmã Domingas, autora espiritual de “Hospital dos Médiuns”, e outras obras de relevância para os nossos postulados doutrinários, procurou-me, um dia desses, com um exemplar da Bíblia nas mãos.
- Dr. Inácio, poderíamos conversar um pouquinho?...
- Claro – assenti.
E, então, entre nós, desdobrou-se rápido diálogo, que tento tornar mais rápido nas escassas linhas deste Blog.
- Doutor, eu não consigo entender...
- O quê?! – perguntei, vendo-a abrir o venerável volume nas páginas do livro de Eclesiastes.
- Está escrito aqui: “Porque na muita sabedoria há muito enfado; e quem aumenta ciência, aumenta a tristeza.” Quer dizer, então, que, por nos trazer tristeza, a ciência não é uma coisa boa?!...
- Eu só fui entender este versículo – disse-lhe –, depois que me tornei espírita, e, mesmo assim, quando os meus cabelos começaram a se alvejar alguns e a cair muitos...
- Pois eu, Doutor, vez e outra, quando encarnada, ouvia algum orador fazer esta citação, mas não explicava nada e, em contrapartida, eu não perguntava...
- Achava-a bonita!...
- Bonita, mas não a entendia! Ora, então a Lei de Progresso?!... Quem aumenta ciência, tem que aumentar alegria, e não tristeza!...
- Também acho! Deus não poderia ter errado...
- Mas, afinal, o que o senhor me diz?! O senhor que sabe mais do que eu...
- Quem lho disse?! – repliquei. – Você está querendo insinuar que eu sou mais triste que você...
- Não! O senhor é até um espírito muito alegre – um dos mais alegres de que, sinceramente, eu tenho notícias. Com o senhor não existe pranto e ranger de dentes...
- Domingas, você sabe, depois da morte, eu recuperei a minha arcada dentária, porque, de fato, se eu tivesse que ranger as minhas dentaduras... Isso é que seria provação: não ter dentes para ranger e nem glândulas lacrimais para chorar!...
- Doutor...
- Calma – solicitei à devotada confreira. – A ciência que aumenta a tristeza não é tanto aquela que nos deu o fogão a gás, a geladeira, o chuveiro de água quente, a TV...
- Também acho que não! Doutor, antes do fogão a gás, a fumaceira que era dentro de casa... E a enceradeira, que substituiu o escovão?! Doutor, eu acabei com os meus joelhos de esfregar palha de aço no chão...
- A ciência que aumenta a tristeza, também não pode ser a da invenção do telefone, do automóvel, do avião...
- Então, não sobra nada que justifique o que segue escrito aqui, o senhor concorda?!...
- Sobra tudo, Domingas?!
- Segundo o que está escrito aí, a ciência que aumenta a tristeza é a ciência de nós mesmos!...
- “Virgem santa que a fome era tanta...”! – exclamou, citando parte da letra de “Pau-de-arara”, que conta a história de um cearense que comia gilete na praia de Copacabana...
- Pois é! A ciência de nossa própria mediocridade é terrível! É mesmo de dançar um xaxado – concordei. E, antes que me critiquem, eu vou incluir aqui o samba, a valsa, o bolero, o tango, e até dança de índio...
Domingas, diminuindo a sua ciência, sorriu a valer, e, depois que conseguiu recompor-se, concluiu:
- Por isso é que Sócrates dizia que a única coisa que ele sabia era que nada sabia, não é?!...
- Ele era um homem muito sábio: para não aumentar a sua tristeza infinitamente, fazia de conta que infinitamente não sabia o que, em relação a outros homens, ele sabia quase infinitamente!...

INÁCIO FERREIRA

Uberaba – MG, 22 de fevereiro de 2016.

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