Criada com mimos excessivos, a jovem
desenvolveu-se na ignorância do trabalho e da responsabilidade, não obstante
pertencer a nobilíssimo quadro social. (...) Desprotegida pelas circunstâncias,
não se preparou convenientemente para enfrentar os problemas do resgate
próprio. Sem a proteção espiritual peculiar à pobreza, sem os abençoados
estímulos dos obstáculos materiais, e tendo, contra as suas necessidades
íntimas, a profunda beleza transitória do rosto, a pobrezinha renasceu, seguida
de perto, não por um inimigo propriamente dito, mas por cúmplice de faltas
graves, desde muito desencarnado, ao qual se vinculara por tremendos laços de
ódio, em passado
próximo. Foi assim que, abusando da liberdade, em ociosidade
reprovável, adquiriu deveres da maternidade sem a custódia do casamento.
Reconhecendo-se agora nesta situação, aos vinte anos, solteira, rica e
prestigiada pelo nome da família, deplora tardiamente os compromissos assumidos
e luta com desespero, por desfazer-se do filhinho imaturo, o mesmo comparsa do
pretérito a que me referi; esse infeliz, por "acréscimo de misericórdia
divina", busca destarte aproveitar o erro da ex-companheira para a
realização de algum serviço redentor, com a supervisão dos nossos Maiores.
(...)
Nunca supus que a mente desequilibrada
pudesse infligir tamanho mal ao próprio patrimônio.
A desordem do cosmo fisiológico acentuou-se,
instante a instante.
Penosamente surpreendido, prossegui no exame
da situação, verificando com espanto que o embrião reagia ao ser violentado,
como que aderindo, desesperadamente, às paredes placentárias.
A mente do filhinho imaturo começou a
despertar à medida que aumentava o esforço de extração. Os raios escuros não
partiam agora só do encéfalo materno; eram igualmente emitidos pela organização
embrionária, estabelecendo maior desarmonia.
Depois de longo e laborioso trabalho, o
entezinho foi retirado afinal...
Assombrado, reparei, todavia, que a
ginecologista improvisada subtraía ao vaso feminino somente pequena porção de
carne inânime, porque a entidade reencarnante, como se a mantivessem atraída ao
corpo materno forças vigorosas e indefiníveis, oferecia condições
especialíssimas, adesa ao campo celular que a expulsava. Semidesperta, num atro
pesadelo de sofrimento, refletia extremo desespero; lamentava-se com gritos
aflitivos; expedia vibrações mortíferas; balbuciava frases desconexas.
Não estaríamos, ali, perante duas feras
terrivelmente algemadas uma à outra? O filhinho que não chegara a nascer
transformava-se em perigosos verdugo do psiquismo materno. Premindo com
impulsos involuntários o ninho de vasos do útero, precisamente na região onde
se efetua a permuta dos sangues materno e fetal, provocou ele o processo
hemorrágico, violento e abundante...
Observei mais.
Deslocado indébitamente e mantido ali por
forças incoercíveis, o organismo perispirítico da entidade, que não chegara a
renascer, alcançou em movimentos espontâneos a zona do coração. Envolvendo os
nódulos da aurícula direita, perturbou as vias do estímulo, determinando
choques tremendos no sistema nervoso central.
Tal situação agravou o fluxo hemorrágico,
que assumiu intensidade imprevista, compelindo a enfermeira a pedir socorros
imediatos, depois de delir, como pôde, os vestígios de sua falta.
- Odeio-o! odeio-o! - clamava a mente
materna em delírio, sentindo ainda a presença do filho na intimidade orgânica.
- Nunca embalarei um intruso que me lançaria à vergonha!
Ambos, mãe e filho, pareciam agora, por
dizer mais exatamente, sintonizados na onda de ódio, porque a mente dele,
exibindo estranha forma de apresentação aos meus olhos, respondia, no auge da
ira:
- Vingar-me-ei! Pagarás cetil por cetil! não
te perdoarei!... Não me deixaste retomar a luta terrena, onde a dor, que nos
seria comum, me ensinaria a desculpar-te pelo passado delituoso e a esquecer
minhas cruciantes mágoas... Renegaste a prova que nos conduziria ao altar da
reconciliação. Cerraste-me as portas da oportunidade redentora; entretanto o
maléfico poder, que impera em ti, habita igualmente minhalma... Trouxeste à
tona de minha razão o lodo da perversidade que dormia dentro de mim. Negas-me o
recurso da purificação, mas estamos agora novamente unidos e arrastar-te-ei
para o abismo...Condenaste-me à morte, e, por isso, minha sentença é igual. Não
me deste o descanso, impediste meu retorno à paz da consciência, mas não
ficarás por mais tempo na Terra... Não me quiseste para o serviço do amor...
Portanto, serás novamente minha para a satisfação do ódio. Vingar-me-ei!
Seguirás comigo!
Os raios mentais destruidores cruzavam-se,
em horrendo quadro, de espírito a espírito.
Em seguida, o Assistente convidou-me a sair,
acrescentando:
- Verificar-se-á a desencarnação dentro de
algumas horas, O ódio, André, diariamente extermina criaturas no mundo, com
intensidade e eficiência mais arrasadoras que as de todos os canhões da Terra
troando a uma vez. É mais poderoso, entre os homens, para complicar os
problemas e destruir a paz, que todas as guerras conhecidas pela Humanidade no
transcurso dos séculos. Não me ouves mera teoria. Viveste conosco, nestes
momentos, um fato pavoroso, que todos os dias se repete na esfera carnal.
Estabelecido o império de forças tão detestáveis sobre essas duas almas
desequilibradas, que a Providência procurou reunir no instituto da
reencarnação, é necessário confiá-las doravante ao tempo, a fim de que a dor
opere os corretivos indispensáveis.
(...)
Calderaro fitou-me com o acabrunhamento de
um soldado valoroso que perdeu temporariamente a batalha, e informou:
- Agora. nada vale a intervenção direta.
Consumou-se para ambos doloroso processo de obsessão recíproca, de amargas
conseqüências no espaço e no tempo, e cuja extensão nenhum de nós pode prever.
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No Mundo Maior - Francisco C Xavier -
André Luiz - Os livros espíritas, como este vendidos em nossa loja, terão o lucro
repassado à Casa Espírita de Oração Amor e Luz de Limeira.
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