Manifestações de um polêmico
Como surgiu o Espiritismo igrejista no
Brasil
Um dos grandes problemas do nosso movimento espírita é achar que
as coisas ruins não devem ser ditas, que devemos ser omissos em relação a elas,
conseqüentemente jogando-as para “debaixo do tapete”, como muito se diz no
popular, daí resultando a desinformação das pessoas que terminam ficando sem
saber como as coisas realmente ocorrem em nosso meio, nos dias de hoje, e como
elas aconteceram no passado.
Daí fica todo mundo imaginando coisas e termina
por formar na cabeça de muita gente uma cultura totalmente deturpada do que
realmente aconteceu na história do Espiritismo.
Um monte de gente se fingindo
de bonzinho nas tribunas dos centros, querendo cada um ser mais Francisco de
Assis do que o outro, com aquelas bondades, humildades e “amor” que visam apenas
impressionar as platéias, para que os vejam parecidos com o Chico Xavier. Quem
tenta fugir disto, sofre restrições sob a argumentação do tal.
- “Não é
conveniente convidar para a nossa casa, porque ele anda dizendo algumas coisas
por aí, que não são muito convenientes”.
Esse tal “algumas coisas” que se
referem são algumas VERDADES que incomodam a muitos, porque verdade é algo que
choca. Só mesmo os “polêmicos” tem coragem de dizer certas verdades.
Mas
vamos lá.
Vejo aí algumas pessoas utilizarem expressões do tipo:
- “O
Doutor Bezerra de Menezes implantou o igrejismo e a idéia do espiritismo apenas
religião, no Brasil. Ele é responsável por esse monte de espiritólicos que
existe por aí. Foi ele quem desvirtuou o Espiritismo do modelo conforme Kardec
queria”.
E dentro desta idéia, reforçam a outra que diz que Chico Xavier
incrementou esse modelo, sobretudo construindo sua base doutrinária nas
orientações de um padre, que é o Espírito Emmanuel. Chico, então, teria sido o
co-responsável por esse processo de igrejamento.
Antes de prosseguir quero
lembrar bem uma recomendação que esse tal “padre” teria dado ao Chico, assim que
propôs acompanhá-lo por toda a sua encarnação, passando ensinamentos que se
transformariam em obras literárias adotadas pelos espíritas:
- “Chico: Se
alguma orientação que eu lhe passar deixar alguma dúvida, abandone a minha
orientação em fique com Kardec”.
Isto demonstra que o tal “padre” agiu com
coerência e desejou que o modelo base fosse de fato o Allan Kardec e não
ele.
Essa recomendação de Emmanuel não foi dirigida apenas ao Chico, mas a
todos os espíritas, e eu aproveito aqui para chamar a atenção dos “emanuelistas”
e também dos “andreluizistas” que existem, aos montes, em nosso meio, para que
reflitam e que prestem bem atenção nessa recomendação.
Então, continuando o
que eu vinha dizendo:
Não foi o Doutor Bezerra quem iniciou o igrejismo
espírita no Brasil, a coisa vem antes dele.
Deixe eu relembrar o que já
passei, outras vezes, através de outros artigos.
Assim que começou a sua
tarefa, Allan Kardec fundou a “Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas”, com
objetivo de ali praticar o Espiritismo conforme o seu modelo. Observem o detalhe
do nome colocado na instituição: Não foi “Centro Espírita Francisco de Assis”,
“Thomás de Aquino”, “Jesus o Consolador”, “Maria de Nazaré”, “Paulo de Tarso” e
muito menos “Amantes da Pobreza”, foi “Sociedade Parisiense de ESTUDOS
ESPÍRITAS”.
Ele queria que ali fosse praticado um Espiritismo exatamente do
jeito que ele praticou, conforme o relato da Revista Espírita, desde a sua
primeira edição até a última.
Aí começaram a surgir os primeiros
entendimentos equivocados logo no começo:
Porque os espíritos sugeriram a
Kardec o nome de Jesus, como UM DOS maiores modelos que devemos seguir... (vejam
bem: sugeriram como “UM DOS” e não como o único modelo)..., passaram a entender
que, pelo fato de ter citado Jesus, necessariamente o Espiritismo teria que ser
uma religião, haja vista que a cultura dominante envolveu o nome de Jesus com
religião, a começar pelo Catolicismo e depois o Protestantismo, que proliferavam
pela Europa.
Pronto. Muitas pessoas, já cansadas das decepções com o
catolicismo e com o protestantismo, encontraram ali uma válvula de escape para
praticarem aquilo que elas se se achavam dependentes, que é a religião. O ser
humano faz questão de ter uma religião, tem que ter religião.
Passaram a
freqüentar a Sociedade Parisiense como religião, como igreja, como rezação.
Não era o que Kardec queria, pois ele chamava muito a atenção contra
aquilo.
Acontece que, como muita gente sabe, é por demais comum determinados
grupos assumirem direção de instituições espíritas e ali quererem implantar o
Espiritismo conforme as suas cabeças, os seus pontos de vistas e afastarem os
que pensam contrário. Sei de casos, inúmeros, que já chegaram até a proibir a
entrada do próprio fundador da casa, por ter idéia original diferente. Relembro
com saudade o grande Oly de Castro, grande bandeirante do Espiritismo no
Maranhão e no Pará, que passou por isto.
Foi o que aconteceu no tempo de
Kardec; criaram uma verdadeira oposição a ele.
Começaram a achar que a
doutrina já estava pronta e que não precisava evoluir em nada e muito menos
acompanhar a Ciência, que bastavam as reuniões entre as quatro paredes do
centro, sem nenhuma necessidade de divulgação, sob a estúpida argumentação de
que espiritismo não necessitava de “vulgarização”.
Vejam bem: A palavra
vulgarizar não significa diminuir, denegrir, prostituir, desmerecer e
desmoralizar como entendem alguns, e sim levar ao conhecimento do grande
público, de todas as populações.
Kardec pensava totalmente ao
contrário.
Quando ele resolveu mandar imprimir grandes quantidades dos
livros, com dinheiro dele, do bolso dele, sem ajuda de espírita nenhum, pra sair
viajando pela Europa, fazendo palestras e promovendo as suas vendas, num
processo de Ampla Divulgação do Espiritismo, a espiritaiada igrejeira ficou
danada da vida e começou a baixar a língua nele.
Foi aí que começou a
lamentável mania de qualificarem os outros como audaciosos, presunçosos,
vaidosos, afoitos, apressados e de quererem aparecer, à custa da
doutrina.
Ficaram com mais raiva, ainda, quando tomaram conhecimento de que o
público que se reunia para escutá-lo, nas cidades por onde ele passava, crescia
assustadoramente, em proporções inimagináveis na Europa da época.
Ainda mais
quando descobriram que ele era APLAUDIDO DE PÉ e que filas se formavam para
abraçá-lo e tomá-lo um autógrafo em um livro. Se naquele tempo existissem
celulares, com certeza inúmeras pessoas gostariam de tirar fotos com ele, assim
como fazem com Divaldo e vários outros expositores hoje.
Foi um verdadeiro
inferno, gente, o que aconteceu. O que aquele homem sofreu na língua da
maledicência espírita foi algo impressionante.
"A Sociedade de Paris se
constituiu foco de continuas intrigas urdidas contra mim por aqueles mesmos que
se declaravam a meu favor e que, de boa fisionomia, na minha presença, pelas
costas me golpeavam"
Allan Kardec - 1867
As pessoas não davam limites
às suas maldades e perversidades ao reagirem contra ele, chamando-o de vaidoso,
presunçoso, prepotente e daí inventaram a estúpida maluquice de que ele teria
ficado RICO, à custa do Espiritismo, devido ao sucesso das vendas dos livros que
conseguia nas suas viagens. Repito que os livros eram impressos com dinheiro
dele.
Dá, agora, para formar a idéia do porquê Camile Flamarion recusou o
convite para presidir a Sociedade Parisiense de Estudos Espíritos, depois que
Kardec desencarnou?
O modismo das calúnias e difamações que muito vemos hoje
no meio espírita, começou ali, quando o objetivo de acabar com a imagem dele
sugeriu a idéia de espalhar para o público que ele era possuidor de carruagem de
4 cavalos, ricos tapetes persas em casa, etc. etc. etc.
É exatamente o que
acontece nos dias atuais, quando acusam Divaldo de elitizar o Espiritismo, pelos
eventos que faz, quando falam em “mercantilização da doutrina” e toda essa
palhaçada que a gente vê por aí a todo instante.
Kardec chegou a se desabafar
sobre essa amarga experiência que viveu e fazia anotações que ficaram guardadas
nas suas gavetas. Foi dessas anotações que surgiu o livro “Obras Póstumas”, onde
ele relata, sem receios e sem papas na língua, tudo o que passou. Consta que
existiam outros relatos de fatos muitos mais graves e de elevado nível de
imoralidade, que fizeram com ele, mas que acharam por bem não fazer constar no
livro, para evitar males maiores.
É exatamente por isto que você não vê, nos
centros espíritas hoje, ninguém divulgar esse livro, que não fica exposto na
maioria dos centros espíritas, não é livro de estudo, e alguns dirigentes chegam
a minimizá-lo, dizendo que ele não tem muita importância.
Sabe o que é isto?
Falta de vergonha na cara, em muitos espíritas, já que muitos morrem de
vergonha, porque nos dias de hoje continuam fazendo exatamente aquilo que
fizeram com o grande Mestre.
Foi por isto que o Espiritismo não deu mais
certo na Europa.
Quando ele desencarnou, em 31 de março de 1869, prevaleceram
aqueles que viraram donos do Espiritismo na época.
Pra começar, acabaram com
a Revista Espírita, mesmo com o enorme sucesso que ela fazia. Podem observar: a
última é exatamente do ano de 1869; não é o Alamar que está inventando
não.
Botaram uma pá de cal em cima de qualquer proposta de divulgação do
Espiritismo e é por isto que ela continua enfrentando dificuldades nos dias de
hoje.
Os detalhes da história são muitos, mas vamos parar por aqui.
E
como foi a chegada no Brasil?
O Espiritismo chegou ao Brasil pelas mãos
de vários, entrando em vários estados. Mas o primeiro foi na Bahia, através de
Luiz Olympio Teles de Menezes, que trazia o modelo conforme Kardec.
O Luiz
Olympio se correspondia assiduamente com Kardec, viraram amigos. Pra começar,
ele criou aqui no Brasil, também, um jornal que se transformaria em revista, que
era o “Eco de Além Túmulo”. Ele queria fazer exatamente como Kardec
fazia.
Aí, já que outros também foram à França e tiveram contato com a
Sociedade Parisiense de Igrejismo Espírita (é isto que se transformou), ao
voltarem para o Brasil trouxeram a idéia contrária, adotada por membros de
“oposição”, que militavam por lá.
Foi exatamente aí que surgiu o espiritismo
igrejeiro no Brasil.
Pra começar, baixaram o cacete no Luiz Olympio.
Começaram a difamá-lo, na Bahia, deram-lhe um desprezo enorme, que ele, que era
funcionários dos Correios, resolveu pedir transferência para o Rio de Janeiro,
achando que lá poderia desenvolver um Espiritismo Coerente, conforme Allan
Kardec.
Quebrou a cara, coitado. Ao chegar ao Rio, também encontrou o
espiritismo igrejeiro instalado, deram-lhe uma banana, foi também caluniado e
desprezado, totalmente abandonado. Quando morreu, consta que apenas quatro
pessoas conduziram o seu funeral, que eram as quatro pessoas que levaram o
caixão ao cemitério, que até hoje espírita nenhum fez o menor esforço, no Rio,
para historicamente identificar onde o seu corpo foi sepultado.
Pronto.
Prevaleceu o espiritismo igrejeiro no Brasil, principalmente no Rio de Janeiro,
onde vivia o Dr. Bezerra de Menezes, que era médico e político.
Quando o
velho cearense começou a ter os primeiros contatos com a novidade, chamada
“espiritismo”, ele viu aquele modelo, aprendeu daquele jeito e concebeu daquele
jeito.
O que é que vocês queriam que ele fizesse? Como vocês queriam que ele
praticasse?
Literatura era coisa rara, naquele momento, a Revista Espírita
não havia sido trazida para o Brasil ainda, a não ser alguns números, através de
alguns assinantes que já existiam por aqui, como existia no mundo todo, adeptos
do modelo Kardec que eram calados, como são até hoje, considerados polêmicos e
coisas parecidas.
Como o doutor Bezerra poderia ter informações exatas do
modelo como Kardec praticava e sugeria que fosse praticado?
Proliferou o
modelo igrejeiro, os primeiros dirigentes espíritas foram igrejeiros e
prevaleceu esse modelo.
Agora vejam o que aconteceu, com o passar dos
anos:
Os primeiros dirigentes espíritas brasileiros foram desencarnando e
começaram a voltar aos centros como Mentores da Casa.
Aí entra em foco aquele
outro artigo que eu escrevi, quando falei da figura “O mentor da casa
espírita”.
Conforme sabemos, os desencarnados são exatamente as mesmas
pessoas que aqui viveram, com os mesmos conhecimentos, a mesma cultura, o mesmo
grau de escolaridade, as mesmas paixões... as mesmas tudo.
Já que o cidadão,
como encarnado, aprendeu um espiritismo daquele jeito, que tipo de espiritismo
vai querer ensinar, quando eleito mentor, depois de desencarnado?
O mesmo
espiritismo igrejeiro, que é o que sabe, não o modelo Kardec.
E é daí que
encontramos a grande maioria dos centros espíritas fazendo este modelo, sob
obediência às recomendações do espírito que chamam de Mentor da Casa.
Não
mudam! Não adianta a Revista Espírita, que hoje está disponível para todos
espíritas, não apenas naquela tradução primeira que chegou ao Brasil, cheia de
erros, mas na atual, de autoria de Evandro Noleto Bezerra, que está muito boa.
Os espíritas não querem saber dela, não têm o menor interesse em procurar saber
como Kardec fazia, o que tem que prevalecer é a Santa Imaculada Igreja Espírita
que foi implantada, com seus dogmas imutáveis.
O que importa é o que diz e
orienta o mentor da casa, que nem eles mesmos sabem quem é. Raro é o centro que
se preocupa em saber quem é o tal mentor e que se dispõe a dialogar e debater
com ele.
- Debater com o mentor da casa, Alamar? Você tá ficando maluco? Você
só pode estar sob sério processo obsessivo, Alamar.
É assim que pensam muitos
espíritas.
Para esses muitos, debater e questionar mentor da casa seria a
mesma coisa que propor a católicos questionarem com a “virgem” Maria.
Então,
amigos, não se pode falar sobre isto e o mais aconselhável é levar para a
fogueira ou para a guilhotina, todo aquele que se atrever a querer um
espiritismo conforme Kardec fez. Já que não podem queimá-los vivos, optam por
qualificá-los como polêmicos, denegrindo a sua imagem para que os freqüentadores
da casa não tenham acesso aos seus argumentos e idéias.
Infelizmente é este o
modelo do Espiritismo que estamos tendo por aqui, que não consegue segurar muita
gente, do mesmo jeito que a Europa não conseguiu mais segurar gente nos tempos
passados.
Se fosse no modelo de Kardec, com certeza teríamos muito mais de 50
milhões de espíritas no Brasil, hoje. Talvez muito mais.
Será que este não é
um assunto para levarmos a debate nos Congressos Espíritas?
Conclusão: Não
quero que ninguém se deixe levar pela cabeça do Alamar, apenas sugiro que
observem a Revista Espírita. Se o que estiver lá for exatamente o que o Alamar
propõe, terá sido apenas mera coincidência.
Fica aí a idéia, então, para
apreciação de todos.
Abração.
Alamar Régis Carvalho
Analista de
Sistemas, Escritor e Antares DINASTIA