22.3.16

NO ATACADO E NO VAREJO

Uma amiga nossa, de nome Dinorah, que nos auxilia em nossas atividades no Hospital dos Médiuns, supervisionando o serviço de limpeza, veio, há três dias, conversar conosco, quase apavorada.
- Dr. Inácio – disse-me –, fui a uma palestra de um orador espírita, na semana passada, e fiquei, deveras, desanimada – uma colega me convidou e eu fui, toda esperançosa, mas...
- O que aconteceu, Dinorah?! – perguntei na sequência da conversa. – Ele falou muitas asneiras?! Mexeu com vocês?!...
- Não, Doutor, ele até que é um homem sério, fala com muita calma e simplicidade – ele não complica, não! Entendi tudo, e a minha colega também – acredito que, enfim, todos os que estavam lá entenderam...
- De quê, então, você está se queixando?! Hoje em dia, quando a gente encontra um orador que fala e a gente entende, a gente precisa se tornar macaco de auditório dele! Por que o que tem de gente falando sem real conhecimento de causa, e mais, imaginando que faz parte de algum show desses programas de auditório na TV norte-americana...
- O senhor sabe: a gente deve ter muitas dívidas relacionadas às vidas passadas – talvez, não o senhor, mas eu tenho!...
- De minha parte – respondi –, sinceramente, não conheço espírito que, de alguma forma, não seja espírito devedor... Todos, ou quase todos, têm dívida no Cartório... Eu, por enquanto, sem querer saber o quanto devo, vou pagando – não está na hora de efetuar um balanço, não, pois a consciência do tamanho da dívida é mais terrível que a própria dívida!...
- Pois é, mas o orador começou a falar de umas miuçalhas, que, sinceramente, eu não imaginava que a Lei pudesse levar em conta umas quirelas...
- Deus é sovina, Dinorah! – exclamei.
- Sovina?! Como assim?!...
- Jesus falou que a gente, enquanto não pagar o último ceitil, não sai da cadeia – demorei a entender que Deus faz contas de “centavos”... O “Homem” é mão aberta para emprestar, mas, na hora de receber, não faz abatimento, não! Eu nunca vi infinita generosidade e sovinice infinita, de uma só vez, reunidas numa “Pessoa” só!...
- Pois é, Doutor! Eu pensava: graças a Deus, não tenho tão grandes dívidas assim para quitar, pois, a minha consciência não me diz que eu já tenha matado, ou que já atentando contra a própria vida, ou que, ainda, tenha sido uma pessoa deliberadamente má, prejudicando comunidades inteiras...
- Que maravilha, Dinorah! Você é uma felizarda, quase uma bem-aventurada!...
- Ah, não brinca, Doutor! O conferencista disse que, depois de a gente saldar as nossas maiores dívidas para com a Lei Divina, vamos ter que começar a quitar as dívidas menores...
- E ele, que deve ser a reencarnação de algum publicano, está certíssimo – repliquei. – É assim mesmo... Primeiro, a gente paga no atacado, e depois no varejo!...
- Mas, quais são essas dívidas que vamos ter que pagar no varejo?! – inquiriu-me. – Por que eu não sou uma pequena grande devedora, mas reconheço que sou uma grande pequena devedora...
- São justamente, Dinorah, as miuçalhas morais: falar mal de uma pessoa aqui, de outra ali; uma mentira aqui, outra ali; uma desonestidade aqui, outra ali; um escorregão aqui, outro ali... A coisa vai longe!...
- Ai, meu Senhor!...
- O “Homem” é meticuloso! – prossegui. – Você não vê que Jesus pregou o Evangelho falando de miudezas: um óbolo, uma dracma, um punhado de fermento, uma pérola, uma semente de mostarda...
- Sim!...
- Então?!...
- Doutor, mas eu pensei que Ele podia...
- Não pode! Ele quer receber tudo... E tem mais: tem juros em cima disso... O “Homem” quer receber, multiplicados, os talentos que empresta!...
Silenciei por instantes e arrematei:
- Então, minha cara, vai cuidando aí do seu serviço, que eu vou cuidar do meu, porque Ele é severo, ceifa onde não semeou e ajunta onde não espalhou!...

INÁCIO FERREIRA

Uberaba – MG, 21 de março de 2016.

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