2.4.20

Bastidores Espirituais do Coronavírus


Giuseppe é socorrido às pressas em sua casa nos arredores de Milão. Estava bastante febril, era como se o seu corpo estivesse literalmente pegando fogo. As tosses aumentaram e uma inquietação tomava-lhe a mente e as emoções. A suspeita de estar com o Coronavírus era concreta, não apenas pelos sintomas, mas porque seus pais, octogenários que residiam com ele, estavam afastados do convívio familiar há alguns dias. Foram igualmente socorridos e, desde então, não tinha mais notícia deles.
Estava apreensivo com toda esta situação. Desempregado, recentemente separado da sua esposa, Giuseppe vivia um drama familiar e particular. Isto fez com que diminuísse grandemente as suas resistências imunológicas. E foi num bar que Giuseppe teve contato com o vírus que devora vidas de modo selvagem.
Teria sido ele o agente transmissor para seus pais? Esta pergunta inquietava sobremaneira a sua consciência.
Ao chegar a uma espécie de hospital da campanha, procurou saber sobre o paradeiro de seus pais. Logo soube que eles haviam morrido. Os responsáveis em dar o atestado de falecimento e fazer a comunicação estavam tão assoberbados de trabalho que a notícia estava sendo dada, de modo geral, com algum período de atraso.
Queixou-se intimamente. Era ele o culpado por aquela situação. Isto fez com que a sua saúde debilitada piorasse mais. Chorava copiosamente naquele isolamento. Era bem atendido, à medida das possibilidades, mas o remorso era gritante dentro de si. Não conseguia se perdoar.
O que faria desde então? Que providência tomar? Tudo era muito confuso na sua mente. Incomunicável a partir de agora, nada poderia falar aos familiares também acometidos com o Coronavírus ou na defensiva para não recebê-lo em seu organismo.
Só, Giuseppe começou a pensar na vida. O que fez e o que deixara de fazer. Sua culpa aumentava quando identificava que poderia ter agido de outra maneira com muita gente, inclusive com seus pais.
Remorso e culpa se misturavam num embate interior que somente lhe destruía as resistências mínimas que ainda possuía.
Foi neste momento que, divagando em seus pensamentos, imaginou que estaria no céu e o que diria a Deus?
Pedira, antecipadamente, perdão por tudo que cometera impensadamente. Fora um tolo em boa parte da vida. Um orgulhoso inveterado. Alguém que somente pensava nele e em ninguém mais. Todos os outros existiam apenas para servi-lo em suas necessidades.
Perdão, perdão, perdão...
Foi então que começou a dormir depois de muito tempo em vigília.
O que está por trás da história de Giuseppe representa, guardadas as proporções e finalidades, o mesmo bastidor de milhares de histórias dos que estão sendo acometidos pela ação nefasta do Coronavírus.
Giuseppe, na sua encarnação transata, fora um beberrão contumaz. Vivia na noite e o pouco que amealhava, fruto de seu trabalho, gastava com mulheres e bebidas.
Num desses encontros, conheceu Belinda. Uma mulher atraente com a qual se encantou fortemente. Belinda passou a ser a razão da sua vida. Com ela teve dois filhos. Parecia que Belinda finalmente tinha conseguido aquietar os impulsos materialistas de Giuseppe.
Passado algum tempo do casamento, Giuseppe volta a frequentar novamente os bares e a noite. Num desses dias memoráveis na vida de um homem preso aos prazeres carnais, conhece uma bailarina de cabaré que lhe entorta a cabeça.
Sentindo ser correspondido, Giuseppe abandona a família e parte para outra cidade com a bela bailarina. Cheio de paixão e volúpia, Giuseppe começa outra vida, distante do seu lar original, e sem nenhum tipo de constrangimento ou sentimento de culpa.
O tempo passa. Giuseppe desencarna e reencontra a sua antiga família. Chega o momento do ajuste de contas com a sua consciência. Irascível, acha que nada fizera de mal para aquelas pessoas. Compreendia a situação criada à sua maneira e conveniência. Ora, por que atrapalhar a vida deles se agora amava outra mulher e desejava seguir outro caminho? Pensou que mais cedo ou mais tarde, Belinda encontraria outro homem e que cuidaria de tudo.
Um egoísta por tendência não consegue enxergar a dor do outro, até porque ela não existe, dada a sua incapacidade de exercitar a empatia.
Pois bem, Giuseppe volta ao corpo físico. Seus dois filhos seriam seus pais nesta nova encarnação. Sua mãe aceitou ser sua filha no novo relacionamento que teria com sua antiga bailarina que, como da outra vez, o abandonaria.
Sua filha, com a qual nutria grande sentimento sem saber o porquê, tratou de dar a ele conselhos para o bem e o incentivava, o tempo todo, para mudar seus pensamentos e o modo de agir.
Sua esposa novamente o abandonou indo morar com outro e levando a filha querida. Desde então, ficara na casa dos pais e remoía-se interiormente de saudade da filha que, efetivamente, o amava e pedia por ele a Deus nas suas orações diárias.
Foi este remorso e culpa do passado que vinha-lhe agora à mente e ele não conseguia explicar a intensidade daquele sentimento transbordante nas lágrimas que solvia.
Giuseppe fazia, enfim, o seu ajuste de contas. O Coronavírus representava, tão-somente, um subterfúgio para que ele pudesse encarar a sua verdade interior frente a frente.
Giuseppe, até este momento, estava moribundo no hospital de campanha, mas seu destino, como o dos outros em penitência interior, será o de exílio do corpo físico e, em momento vindouro e propício, reencontrar-se com a sua própria consciência e proceder a mudança de comportamento que a reencarnação sempre proporciona na vida das pessoas.
A vida de Giuseppe, como a sua, está nas suas mãos.
Combata o vírus do egoísmo e da indiferença.
Seja solidário com a dor do outro. Promova a mudança inadiável dos seus pensamentos e atos.
O mundo será melhor quando cada ser humano provocar a sua mudança particular.
Seja você com Deus!

Ariosto – Blog de Carlos Pereira.

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