14.3.14


Velhice

Será que alguém gosta de ser chamado de velho?
Velho quer dizer, quase sempre, algo desprezível, sem utilidade, obsoleto, sem serventia.
Velho é associado a algo ultrapassado, sem ter o que dizer, fora de moda.
Velho parece, para muita gente, alguém que já passou o seu tempo, mas ainda vive.
Esquecem, muitos desses, que um dia, também, serão velhos, se é que conseguirão chegar lá.
Fui um velho na carne, um bom velho, já que morri aos 90 anos de idade, e não me sentia um inválido. Até onde as forças me foram possíveis, realizei muitas coisas.
A sabedoria dos velhos, meus caros, é inesgotável. O velho, sem nenhum tom depreciativo, é um estágio natural do ser humano na sua vida física, mas o que vale mais, o que importa de verdade, não é a velhice do corpo, é a velhice das ideias.
Conheci gente novíssima e que, na realidade, era mais velho que eu. Cabeça jovem não é privilégio da idade, é conquista do espírito.
Quando me chamavam de velho querendo, de alguma forma, me diminuir, não me magoava. Eles, os que diziam isto, não passaram pelo que eu passei, não aprenderam o que eu aprendi, não superaram o que eu superei.
Quem acha que velho não tem mais o que dar está muito enganado. Velho é um estado de espírito, portanto, procure um velho jovem e você verá que ele será mais produtivo e sábio do que muitos moços juntos.
O peso da idade, é claro, limita, de alguma maneira, os movimentos. Parece que o tempo, de certa forma, vai criando raízes na terra junto ao corpo tornando-o um fardo, quase a se arrastar pelo chão, mas, tirando a “obsolescência” do organismo próximo à exaustão, a mente de um velho é coisa raríssima, inimaginável de possibilidades, porque o velho possui, pela força da experiência, uma capacidade associativa impressionante. Por já ter passado por muitas experiências na vida, a possibilidade de criação se torna maior e de mais qualidade.
Vejo por aqui que os velhos remoçam, ficam mais jovens na aparência. Eu mesmo me mantenho quando tinha uns 60 e poucos anos. A mente limpa por aqui consegue provocar este fenômeno do rejuvenescimento, coisa legal.
Mesmo do lado de cá da vida, conheço muitos jovens velhos e também muitos velhos jovens. Não é porque se morre que se deixa de pensar de um jeito ou de outro. A juventude, já disse em outras oportunidades, é atributo daquele que possui mil razões para viver.
Há gente deste lado que parece que continua morta, sem ânimo, sem força para viver e se renovar. Vivem no passado. Costumam dizer sempre: “porque no meu tempo...”
Meu Pai, quanta gente por aqui vive mais presa ao passado do que ao presente e, sobretudo, ao futuro.
Tem gente que está mais com os pés na terra do que no mundo espiritual. Se pudessem, voltavam de mala e cuia para viver a mesma vida de antes.
Vida é renovação e somente é velho quem fica absorvido no passado e nas antigas ideias. Há gente que não quer enxergar que o mundo muda – e rapidamente.
Velho não sou. Velho nunca me considerei ser, sobretudo porque ouvia muito aos jovens, procurava aprender com eles, estar próximo de suas ideias e vontades.
Não quer dizer, absolutamente, que tudo que vem de jovem é bom e o que vem de velho é ruim, ou vice-versa, nada disso.
A juventude pode aprender com a sabedoria da idade e os mais maduros podem arejar as suas mentes com a pujança dos mais novos.
Sou um bom velho. A minha idade mental será sempre de uma criança se aproximando da adolescência. É a idade da descoberta, da imaginação, dos grandes sonhos, do entusiasmo total.
Prefiro que me chamem de criança inquieta do que de velho gagá.
São as ideias que representam o espelho da idade e não o tempo contado no corpo.
É isso aí!
Helder Camara

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