Velhice
Será que alguém gosta de ser chamado de velho?
Velho quer
dizer, quase sempre, algo desprezível, sem utilidade, obsoleto, sem
serventia.
Velho é associado a algo ultrapassado, sem ter o que dizer, fora
de moda.
Velho parece, para muita gente, alguém que já passou o seu tempo,
mas ainda vive.
Esquecem, muitos desses, que um dia, também, serão velhos, se
é que conseguirão chegar lá.
Fui um velho na carne, um bom velho, já que
morri aos 90 anos de idade, e não me sentia um inválido. Até onde as forças me
foram possíveis, realizei muitas coisas.
A sabedoria dos velhos, meus caros,
é inesgotável. O velho, sem nenhum tom depreciativo, é um estágio natural do ser
humano na sua vida física, mas o que vale mais, o que importa de verdade, não é
a velhice do corpo, é a velhice das ideias.
Conheci gente novíssima e que, na
realidade, era mais velho que eu. Cabeça jovem não é privilégio da idade, é
conquista do espírito.
Quando me chamavam de velho querendo, de alguma forma,
me diminuir, não me magoava. Eles, os que diziam isto, não passaram pelo que eu
passei, não aprenderam o que eu aprendi, não superaram o que eu superei.
Quem
acha que velho não tem mais o que dar está muito enganado. Velho é um estado de
espírito, portanto, procure um velho jovem e você verá que ele será mais
produtivo e sábio do que muitos moços juntos.
O peso da idade, é claro,
limita, de alguma maneira, os movimentos. Parece que o tempo, de certa forma,
vai criando raízes na terra junto ao corpo tornando-o um fardo, quase a se
arrastar pelo chão, mas, tirando a “obsolescência” do organismo próximo à
exaustão, a mente de um velho é coisa raríssima, inimaginável de possibilidades,
porque o velho possui, pela força da experiência, uma capacidade associativa
impressionante. Por já ter passado por muitas experiências na vida, a
possibilidade de criação se torna maior e de mais qualidade.
Vejo por aqui
que os velhos remoçam, ficam mais jovens na aparência. Eu mesmo me mantenho
quando tinha uns 60 e poucos anos. A mente limpa por aqui consegue provocar este
fenômeno do rejuvenescimento, coisa legal.
Mesmo do lado de cá da vida,
conheço muitos jovens velhos e também muitos velhos jovens. Não é porque se
morre que se deixa de pensar de um jeito ou de outro. A juventude, já disse em
outras oportunidades, é atributo daquele que possui mil razões para viver.
Há
gente deste lado que parece que continua morta, sem ânimo, sem força para viver
e se renovar. Vivem no passado. Costumam dizer sempre: “porque no meu
tempo...”
Meu Pai, quanta gente por aqui vive mais presa ao passado do que ao
presente e, sobretudo, ao futuro.
Tem gente que está mais com os pés na terra
do que no mundo espiritual. Se pudessem, voltavam de mala e cuia para viver a
mesma vida de antes.
Vida é renovação e somente é velho quem fica absorvido
no passado e nas antigas ideias. Há gente que não quer enxergar que o mundo muda
– e rapidamente.
Velho não sou. Velho nunca me considerei ser, sobretudo
porque ouvia muito aos jovens, procurava aprender com eles, estar próximo de
suas ideias e vontades.
Não quer dizer, absolutamente, que tudo que vem de
jovem é bom e o que vem de velho é ruim, ou vice-versa, nada disso.
A
juventude pode aprender com a sabedoria da idade e os mais maduros podem arejar
as suas mentes com a pujança dos mais novos.
Sou um bom velho. A minha idade
mental será sempre de uma criança se aproximando da adolescência. É a idade da
descoberta, da imaginação, dos grandes sonhos, do entusiasmo total.
Prefiro
que me chamem de criança inquieta do que de velho gagá.
São as ideias que
representam o espelho da idade e não o tempo contado no corpo.
É isso
aí!
Helder Camara
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