23.7.20

A Bondade é Infinita

A mulher estava à beira da estrada para pedir uma carona. Aquele lugar era meio deserto e ficar por ali dando bandeira para a sorte não seria interessante. Em dado momento, uma carroça passou. Bem, não era aquilo que ela imaginava como uma carona, mas daria para o gasto. E lá foi ela para seu destino. Num carro de boi.
Lá para as tantas, já chegando perto da sua casa, ela agradeceu a carona e perguntou o nome do seu salvador.
- Me chamo Benedito, senhora, mas pode me chamar de Bento que dá na mesma coisa. É assim que me chamam.
- Mas que bela surpresa. Tenho um filho que se chama Bento, mas não é Benedito feito o senhor.
- Pois é, minha mãe me botou esse nome por causa da minha pele escura. Ela dizia que já que eu era nego mesmo pelo menos que eu tivesse o nome de um nego importante.
- E o senhor sabe que foi esse Benedito famoso?
- Sei não, senhora, mas já me disseram que era um santo.
- Isso mesmo, um santo, São Benedito. Também não conheço muito a história dele, mas dizem que ele era um homem bom assim feito o senhor.
- Sou bom não, minha senhora, faço o que a vida manda eu fazer. Se ela me manda para um lugar eu vou. Se ela me dá a oportunidade de ajudar alguém, eu ajudo. Só faço o que a minha vida me concede fazer.
- E isto não é um sinal de bondade, Benedito, ou melhor, Bento? Se cada um fizesse o que você faz o mundo estaria outro, homem de Deus.
- Pois é, e eu não reclamo não. Dou o que a vida me dá e ela me devolve com mais bondade. Sou merecedor de tudo isso não, mas se chegou até a mim, então agradeço e sigo em frente.
- O que você não se sente merecedor, homem de Deus?
- Da bondade infinita de Deus. Tenho saúde, tenho paz de espírito, tenho minha casinha para me abrigar, tenho um pratinho de comida todo dia. Então sou muito feliz pela bondade de Deus na minha vida.
- É, Bento, tem gente que tem tudo isso em abundância e ainda critica Deus porque quer sempre mais. Estas pessoas estão chateadas porque queriam ter mais do que têm. São pessoas inconformadas pelo que a vida dá.
- Entendo disso não, minha senhora, cuido da minha vida e deixo que cada um cuide da sua. Sou feliz assim e isto me basta.
- Você nunca quis sair daqui não, Bento?
- Pra quê se tenho tudo que preciso e até um pouco mais?
- Admiro você, Bento, o mundo está doente porque tem muita gente insaciável, exatamente porque não pensa como você.
- Sei de nada não, minha senhora, só faço a minha parte, do outro, Deus cuida melhor.
- É isso mesmo, Bento! Eita! Já cheguei na minha casa, meu senhor. Quanto eu te devo?
- O que é isso, dona, eu é que tenho que agradecer o proseio e eu vinha passar por aqui mesmo. Eu é que digo muito obrigado pela companhia.
E lá se foi Bento pela estrada afora.
Minervina ficou feliz por encontrar no caminho uma pessoa da qualidade de Bento e aprender tanto com ele em pouco tempo. Homem sábio e bom – pensou ela.
Ao chegar em casa se deparou com uma cena surpreendente. Seu filho de dois anos estava com um machucão na perna. Havia brincado de correr junto com os amigos da vizinhança, escorregou, caiu e se feriu levemente, mas sabe como é que é criança que se machuca pela primeira vez.
Foi aí então que ela se lembrou da recente conversa com Seu Bento e, como boa mãe que era, começou recitar uns versos em forma de canção enquanto cuidava dos ferimentos do seu querido Bento.
A dor logo passou e Bento, feliz da vida, voltou para brincar com seus amiguinhos e já esquecido da trela que tivera há pouco tempo.
Na vida tudo passa. O que antes era grande coisa, hoje pode se mostrar inexpressivo. Uma ferida grande de ontem pode nem mais ser percebida.
O que fica na vida, no entanto, é a bondade que o outro faz pra gente e a bondade que a gente faz pro outro.
Bondade não se esquece porque a bondade enobrece a alma.
Bondade é qualidade de gente grande, gente que já percebeu que a vida somente tem sentido quando nos doamos ao próximo, seja ele quem for.
Bento nem sabia o nome de Minervina, simplesmente ajudou e seguiu, mas Minervina até hoje se lembra daquele gesto generoso do bom Bento.
E assim a vida prossegue, fruto da bondade de muitos que deixaram no caminho o seu lastro de amor ao outro.
Até mais ver, Bento!

Ariano Suassuna - Blog de Carlos Pereira

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