9.1.22

Hora de tirar a Máscara

Praticamente dois anos de convivência com uma pandemia mundial. Costumes foram modificados. O trabalho ressignificado. A economia readaptada. Tudo mudou. A vida talvez nunca mais seja a mesma. Cuidados. Prevenções. Tudo para evitar a contaminação do vírus e a possibilidade de ser afetado de maneira mais grave. A orientação dos médicos e especialistas centra-se no distanciamento social preventivo, na limpeza contínua das mãos e no uso de máscara. 
Apesar de ser importante, o fato é que a máscara incomoda. Dificulta a respiração, esconde o rosto, atrapalha a fala, causa desconforto. Com as vacinas em dia, os mais próximos aventuram-se em tirá-la, principalmente no seio da família e nos lugares abertos. Eita vontade de tirar definitivamente a máscara do rosto. Um dia, quiçá não esteja muito distante, voltaremos ao normal – ou ao que se convencionou denominar de novo normal. 
Outra máscara, porém, parece que muitos, para não afirmar a grande maioria das pessoas, não está disposta a retirá-la da face: a máscara da personalidade. 
A máscara é a parte da eu que se mostra na relação social, mas que não representa a originalidade do ser. É a face do que se acha que deveria ou gostaria de ser, portanto, uma falsa aparência da realidade interior. Uma farsa de si mesmo. 
Esta máscara causa incômodos profundos. Primeiramente, porque é difícil sustentar externamente por muito tempo uma personagem, depois, porque as feridas que se acumulam internamente destroem, pouco a pouco, as resistências do espírito. 
Este mecanismo de defesa tem origem na autoimagem idealizada que se cria e alimenta. Há uma vontade de passar uma imagem de perfeição que não se tem. Tenta-se esconder para o mundo, como se isso fosse possível, as mazelas que possui. Na busca de passar uma projeção de invulnerabilidade, a pessoa se choca com seu eu verdadeiro provocando desarmonia e sequelas íntimas. 
O perfeccionismo se manifesta, maioria das vezes, na tentativa de controle de si, dos outros e das situações. Para isso, no convívio social, o perfeccionista cria padrões para tudo, é exigente, autoritário e impiedoso. Rigoroso e rígido, impõe-se uma disciplina exagerada. 
Na face de fachada deseja se mostrar sentimentalmente intocável, absolutamente no controle do que faz e uma tranquilidade à toda prova. Tremenda mentira. Na verdade, é um carente, inseguro e ansioso. 
Um dia, este castelo de cartas da personalidade desaba. 
Depressão e ansiedade são consequências naturais dessa patologia espiritual. Como não consegue controlar o hoje, foge deliberadamente para o passado ou para o futuro. É a defesa que encontra para o não enfrentamento da realidade interior. 
Para se curar da máscara que se impôs, a primeira providência é buscar a autoaceitação. A descoberta que vive num mundo irreal e tóxico. Não se culpar pelo que fez ou deixou de fazer é um bom começo. E não se punir por ser o que ainda é. Ou está. 
Sim, porque todos estamos em processo de progresso espiritual. O estágio atual é o que foi possível conquistar até o momento, com acertos e equívocos. 
Somos seres perfectíveis, mas o caminho da perfeição está bastante distante e somente ocorrerá quando nos identificarmos com a divindade que nos é inerente. Até lá, no entanto, é imprescindível tirar a máscara, aceitar a inferioridade momentânea, aprender como funciona nossa dinâmica interior e agir na direção da transformação. 
Tirar a máscara é permitir-se ser vulnerável, imperfeito, autêntico. 
Tirar a máscara é ter a coragem para ser o que é. 
Tirar a máscara é desiludir-se, ter honestidade emocional. 
Isto dói, claro que dói! Tenha paciência consigo, porém. O amadurecimento espiritual não se dá do dia para a noite. Quando ele se inicia percebe-se a inutilidade da máscara e da vã corrida desenfreada para ser apressadamente perfeito. 
O Cristo nos ordenou “Sede Perfeitos!”, é verdade, mas no tempo de cada um e com sinceridade de propósito. 
Enquanto a pandemia da Covid-19 ainda nos exige o uso da máscara física, comecemos agora a tirar a máscara da pandemia do orgulho. 
No novo mundo que já se elabora, vírus algum terá vez. 
Carlos Pereira - Blog de Carlos Pereira

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