29.2.24

O RICAÇO DISTRAÍDO

Existiu um homem devoto que chegou ao céu e, sendo recebido por um anjo do Senhor, implorou, enlevado:
-          Mensageiro Divino, que devo fazer para vir morar, em definitivo, ao lado de Jesus?
-          Faze o bem – informou o Anjo – e volta mais tarde.
-          Posso rogar-te recursos para semelhante missão?
-          Pede o que desejas.
-          Quero dinheiro, muito dinheiro, para socorrer o meu próximo.
O emissário estranhou o pedido e considerou:
-          Nem sempre o ouro é o auxiliar mais eficiente para isso.
-          Penso, contudo, meu santo amigo, que, sem o ouro, é muito difícil praticar a caridade.
-          E não temes as tentações do caminho?
-          Não.
-          Terás o que almejas – afirmou o mensageiro -, mas não te esqueças de que o tesouro de cada homem permanece onde tem o coração, porque toda alma reside onde coloca o pensamento. Tuas possibilidades materiais serão multiplicadas. No entanto, não ouvides que as dádivas divinas, quando retidas despropositadamente pelo homem, sem qualquer proveito para os semelhantes, transformam-no em prisioneiro delas. A lei determina sejamos escravos dos excessos a que nos entregarmos.
Prometeu o homem exercer a caridade, servir extensamente e retornou ao mundo.
Os Anjos da Prosperidade começaram, então, a ajudá-lo.
Multiplicaram-lhe, de início, as peças de roupa e os pratos de alimentação; todavia, o devoto já remediado suplicou mais roupas e mais alimentos.
Deram-lhe casa e haveres. Longe, contudo, de praticar o bem, considerava sempre escassos os bens que possuía e rogou mais casas e mais haveres. Trouxeram-lhe rebanhos e chácaras, mas o interessado em subir ao paraíso pela senda da caridade, temendo agora a miséria, implorou mais rebanhos e mais chácaras. Não cedia um quarto, nem dava uma sopa a ninguém, declarando-se sem recursos para auxiliar os necessitados e esperava sempre mais, a fim de distribuir algum pão com eles. No entanto, quanto mais o Céu lhe dava, mais exigia do Céu.
De expontâneo e alegre que era, passou a ser desconfiado, carrancudo e arredio.
Receando amigos e inimigos, escondia grandes somas em caixa forte, e quando envelheceu, de todo, veio a morte, separando-o da imensa fortuna.
Com surpresa, acordou em espírito, deitado no cofre grande.
Objetos preciosos, pedaços de ouro e prata e vastas pilhas de cédulas  usadas serviam-lhe de leito.
Tinha fome e sede, mas não podia servir-se das moedas; queria a liberdade, porém, as notas de banco pareciam agarrá-lo, à maneira de visco retentor de pássaro cativo.
-          Santo Anjo! – gritou, em pranto – vem! Ajuda-me a partir, em direção à Casa Celestial!...
O mensageiro dignou-se a baixar até ele e, reparando-lhe o sofrimento, exclamou:
-          É muito tarde para súplicas! Estás sufocado pelas correntes de facilidades materiais que o Senhor te confiou, porque a fizeste rolar tão-somente em torno de ti, sem qualquer benefício para os irmãos de luta e experiência...
-          E que devo fazer – implorou o infeliz – para retomar a paz e ganhar o paraíso?
O Anjo pensou, pensou... e respondeu:
-          Espalha com proveito as moedas que ajuntas-te inutilmente, desfaze-te da terra vasta que retiveste em vão, entrega à circulação do bem todos os valores que recebeste do Tesouro Divino e que amontoaste em derredor de teus pés, atendendo ao egoísmo, à vaidade, à avareza e à ambição destrutiva e, depois disso, vem a mim para retomarmos o entendimento efetuado a sessenta anos...
Reconhecendo, porém, o homem que já não  dispunha de um corpo de carne para semelhante serviço, começou a gritar e blasfemar, como se o inferno estivesse morando em sua própria consciência. 
 
Livro: Alvorada Cristã - Francisco C. Xavier - Neio Lúcio.

Nenhum comentário:

Postar um comentário