...Inquieto, recorri ao
Instrutor, rogando-lhe ajuda.
— André — respondeu ele,
circunspecto, evidenciando a gravidade do assunto — compreendo-te o espanto.
Vê-se, de pronto, que és novo em serviços de auxílio. Já ouviste falar, de
certo, numa “segunda morte”
— Sim — acentuei —, tenho
acompanhado vários amigos à tarefa reencarnacionista, quando, atraídos por
imperativos de evolução e redenção, tornam ao corpo de carne. De outras vezes,
raras aliás, tive notícias de amigos que perderam o veículo perispiritual,
conquistando planos mais altos. A esses missionários, distinguidos por elevados
títulos na vida superior, não me foi possível seguir de perto.
Gúbio sorriu e considerou:
— Sabes, assim, que o vaso
perispirítico é também transformável e perecível, embora estruturado em tipo de
matéria mais rarefeita.
— Sim... — acrescentei,
reticencioso, em minha sede de saber.
— Viste companheiros —
prosseguiu o orientador —, que se desfizeram dele, rumo a esferas sublimes,
cuja grandeza por enquanto não nos é dado sondar, e observaste irmãos que se
submeteram a operações redutivas e desintegradoras dos elementos perispiríticos
para renascerem na carne terrestre. Os primeiros são servidores enobrecidos e
gloriosos, no dever bem cumprido, enquanto que os segundos são colegas nossos,
que já merecem a reencarnação trabalhada por valores intercessores, mas, tanto
quanto ocorre aos companheiros respeitáveis desses dois tipos, os ignorantes e
os maus, os transviados e os criminosos também perdem, um dia, a forma
perispiritual.
Pela densidade da mente,
saturada de impulsos inferiores, não conseguem elevar-se e gravitam em derredor
das paixões absorventes que por muitos anos elegeram em centro de interesses
fundamentais. Grande número, nessas circunstâncias, mormente os participantes
de condenáveis delitos, imantam-se aos que se lhes associaram nos crimes. Se o
discípulo de Jesus se mantém ligado a Ele, através de imponderáveis fios de
amor, inspiração e reconhecimento, os pupilos do ódio e da perversidade se
demoram unidos, sob a orientação das inteligências que os entrelaçam na rede do
mal. Enriquecer a mente de conhecimentos novos, aperfeiçoar-lhe as faculdades
de expressão, purificá-la nas correntes iluminativas do bem e engrandecê-la com
a incorporação definitiva de princípios nobres é desenvolver nosso corpo
glorioso, na expressão do apóstolo Paulo, estruturando-o em matéria sublimada e
divina. Essa matéria, André, é o tipo de veículo a que aspiramos, ao nos
referirmos à vida que nos é superior. Estamos ainda presos às aglutinações
celulares dos elementos físioperispiríticos, tanto quanto a tartaruga permanece
algemada à carapaça. Imergimo-nos dentro dos fluidos carnais e deles nos
libertamos, em vicioso vaivém, através de existências numerosas, até que
acordemos a vida mental para expressões santificadoras. Somos quais arbustos do
solo planetário. Nossas raízes emocionais se mergulham mais ou menos
profundamente nos círculos da animalidade primitiva. Vem a foice da morte e
seganos os ramos dos desejos terrenos; todavia, nossos vínculos guardam extrema
vitalidade nas camadas inferiores e renascemos entre aqueles mesmos que se
converteram em nossos associados de longas eras, através de lutas vividas em
comum, e aos quais nos agrilhoamos pela comunhão de interesses da linha
evolutiva em que nos encontramos.
As elucidações eram belas e
novas aos meus ouvidos, e, em razão disso, calei as interrogações que me
vagueavam no íntimo, para atenciosamente registrar as considerações do
Instrutor, que prosseguiu:
— A vida física é puro
estágio educativo, dentro da eternidade, e a ela ninguém é chamado a fim de
candidatar-se a paraísos de favor e, sim, à moldagem viva do céu no santuário
do Espírito, pelo máximo aproveitamento das oportunidades recebidas no
aprimoramento de nossos valores mentais, com o desabrochar e evolver das
sementes divinas que trazemos conosco. O trabalho incessante para o bem, a
elevação de motivos na experiência transitória, a disciplina dos impulsos
pessoais, com amplo curso às manifestações mais nobres do sentimento, o esforço
perseverante no infinito bem, constituem as vias de crescimento mental, com
aquisição de luz para a vida imperecível. Cada criatura nasce na Crosta da
Terra para enriquecer-se através do serviço à coletividade. Sacrificar-se é
superar-se, conquistando a vida maior. Por isto mesmo, o Cristo asseverou que o
maior no Reino Celeste é aquele que se converter em servo de todos. Um homem
poderá ser temido e respeitado no Planeta pelos títulos que adquiriu à
convenção humana, mas se não progrediu no domínio das ideias, melhorando-se e
aperfeiçoando-se, guarda consigo mente estreita e enfermiça. Em suma, ir à
matéria física e dela regressar ao campo de trabalho em que nos achamos
presentemente, é submetermo-nos a profundos choques biológicos, destinados à
expansão dos elementos divinos que nos integrarão, um dia, a forma gloriosa.
E porque me visse na atitude
do aprendiz que interroga em silêncio, Gúbio asseverou:
— Para fazer-me mais claro,
voltemos ao símbolo da árvore, O vaso físico é o vegetal, limitado no espaço e
no tempo, o corpo perispirítico é o fruto que consubstancia o resultado das
variadas operações da árvore, depois de certo período de maturação, e a matéria
mental é a semente que representa o substrato da árvore e do fruto,
condensando-lhes as experiências. A criatura para adquirir sabedoria e amor
renasce inúmeras vezes, no campo fisiológico, à maneira da semente que regressa
ao chão. E quantos se complicam, deliberadamente, afastando-se do caminho reto
na direção de zonas irregulares em que recolhem experimentos doentios, atrasam,
como é natural, a própria marcha, perdendo longo tempo para se afastarem do
terreno resvaladiço a que se relegaram, ligados a grupos infelizes de
companheiros que, em companhia deles, se extraviaram através de graves
compromissos com a leviandade ou com o desequilíbrio. Compreendeste, agora?
Apesar da gentileza do
orientador, que fazia o possível por clarear o seu pensamento, ousei indagar:
— E se consultarmos esses
esferóides vivos? ouvirnos-ão? possuem capacidade de sintonia?
Gúbio atendeu, solícito:
— Perfeitamente,
compreendendo-se, porém, que a maioria das criaturas, em semelhante posição nos
sítios inferiores quanto este, dormitam em estranhos pesadelos. Registram-nos
os apelos, mas respondem-nos, de modo vago, dentro da nova forma em que se
segregam, incapazes que são, provisoriamente, de se exteriorizarem de maneira
completa, sem os veículos mais densos que perderam, com agravo de
responsabilidade, na inércia ou na prática do mal. Em verdade, agora se
categorizam em conta de fetos ou amebas mentais, mobilizáveis, contudo, por entidades
perversas ou rebeladas. O caminho de semelhantes companheiros é a reencarnação
na Crosta da Terra ou em setores outros de vida congênere, qual ocorre à
semente destinada à cova escura para trabalhos de produção, seleção e
aprimoramento. Claro que os Espíritos em evolução natural não assinalam
fenômenos dolorosos em qualquer período de transição, como o que examinamos. A
ovelha que prossegue, firme, na senda justa, contará sempre com os benefícios
decorrentes das diretrizes do pastor; no entanto, as que se desviam, fugindo à
jornada razoável, pelo simples gosto de se entregarem à aventura, nem sempre
encontrarão surpresas agradáveis ou construtivas.
O orientador silenciou por
momentos e perguntou, em seguida:
— Entendeste a importância de
uma existência terrestre?
Sim, entendia, por
experiência própria, o valor da vida corporal na Crosta Planetária; contudo,
ali, diante dos esferóides vivos, tristes mentes humanas sem apetrechos de
manifestação, meu respeito ao veículo de carne cresceu de modo espantoso.
Alcancei, então, com mais propriedade, o sublime conteúdo das palavras do
Cristo: “andai, enquanto tendes luz”. O assunto era fascinante e tentei Gúbio a
examiná-lo, mais detidamente; todavia, o orientador, sem trair a cortesia que
lhe é característica, recomendou-me esperasse o dia seguinte.
Livro: Libertação Francisco C
Xavier - Andre Luiz - CAP. 06 - OBSERVAÇÕES E NOVIDADES
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